Brasil quer que deportações atendam a requisitos mínimos de dignidade e descarta voo da FAB, diz ministro das Relações Exteriores
No fim de semana, chegou ao Brasil um voo dos EUA com 88 deportados. Eles desembarcaram em Manaus algemados nas mãos e nos pés, o que gerou descontentamento no governo brasileiro. Mauro Vieira, ministro das Relações Exteriores
GloboNews/Reprodução
O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, afirmou que o Brasil quer que as deportações de brasileiros dos Estados Unidos atendam requisitos mínimos de dignidade. Ele descartou que sejam usados voos da Força Aérea Brasileira (FAB) para esse fim.
No fim de semana, chegou ao Brasil um voo dos EUA com 88 deportados. Eles desembarcaram em Manaus algemados nas mãos e nos pés, o que gerou descontentamento no governo brasileiro. Também reclamaram de falta de ar-condicionado e de uso do banheiro durante o voo realizado pelo governo norte-americano (veja mais abaixo).
Vieira falou com a imprensa após uma reunião no Palácio do Planalto, em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu ministros, representantes da Força Aérea Brasileira (FAB) e da Polícia Federal para tratar da deportação de cidadãos brasileiros pelos Estados Unidos.
"Acabamos de ter uma reunião de informação ao presidente da República sobre a situação do voo em que foram repatriados 88 brasileiros que estavam nos Estados Unidos. O objetivo da reunião, além de transmitir ao presidente o que aconteceu, o relato da situação, foi também de discutir formas de tratar o tema daqui para diante e de se discutir com as autoridades americanas que as deportações para eles, e repatriação para o Brasil, sejam feitas atendendo os requisitos mínimos de dignidade, respeito aos direitos humanos, a atenção necessária aos passageiros de uma viagem dessa extensão", afirmou o ministro.
Mas voos bancados pelo Estado brasileiro estão fora de cogitação, segundo ele.
"Não foi cogitado e não será feito com aeronaves da Força Aérea. Isso é uma questão do governo americano que tem que mandar os brasileiros", continuou o ministro.
Vieira ressaltou que o problema no ar-condicionado deu caráter "trágico" ao voo.
"Essa operação foi trágica justamente por uma questão de um defeito, de um problema mecânico no avião, problema de ar refrigerado, e chamou a atenção para esse fato e, justamente, nos faz agora trabalhar para, junto com as autoridades americanas, procurar formas de que seja feito de acordo com a legislação brasileira e também com as normas de segurança e de acolhimento dentro de uma aeronave", explicou.
A orientação dentro do governo, no entanto, é não criar atrito com o presidente recém empossado dos EUA, Donald Trump. A gestão Lula não quer se indispor com um país parceiro histórico do Brasil, ainda mais neste início de mandato nos EUA.
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Diálogo com os EUA
O governo planeja que o diálogo com os norte-americanos seja feito em um grupo de trabalho reúna autoridades dos dois países. A ideia é repactuar o entendimento de quais procedimentos serão aplicados nas deportações.
O governo dos Estados Unidos também apura o episódio envolvendo os brasileiros que foram algemados e acorrentados, já que foi quem contratou o voo e é responsável pelo transporte dos deportados.
Além disso, em relação à Operação Acolhida – que contava com financiamento dos Estados Unidos cortado por Trump – o Palácio do Planalto pediu aos ministérios envolvidos no atendimento dos venezuelanos em Roraima que listem quais as necessidades para manter o atendimento para que o governo realoque recursos para manter a operação.
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Voo com deportados
Após a chegada do voo em Manaus, o governo brasileio mandou retirar as algemas. A FAB disponibilizou uma aeronave militar para concluir o transporte do grupo até Belo Horizonte (MG).
A decisão foi tomada pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, com base no entendimento de que o tratamento dado aos deportados é uma questão de soberania nacional.
Apesar da tensão gerada pelo episódio, o governo brasileiro tem enfatizado a intenção de evitar qualquer confronto com os Estados Unidos.
"Não queremos provocar o governo americano, mas é fundamental que os brasileiros deportados sejam tratados com dignidade", disse nesta segunda o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski.
Segundo ele, a deportação está prevista em tratados vigentes, mas o tratamento dado a essas pessoas em solo brasileiro é responsabilidade do governo federal.
O Ministério das Relações Exteriores (MRE) já havia cobrado explicações do governo norte-americano sobre o uso "indiscriminado" de algemas, considerado inaceitável e em desacordo com acordos bilaterais.
Centro de acolhimento
Também após a reunião com Lula, a ministra dos Direitos Humanos, Macaé Evaristo, anunciou a criação de um centro de acolhimento em Minas Gerais para receber cidadãos brasileiros deportados dos Estados Unidos.
"Conversamos com o presidente e fomos autorizados a começar as tratativas para estabelecer em Confins um posto de atendimento humanitário. Trabalhar para garantir que as famílias não venham separadas, que tenham alimentação. Como recebemos bem todo mundo, precisamos ter esse cuidado. Tem gente que precisa de apoio quando chega, já temos tratativas para apoiá-los a também encontrar ocupação", disse a ministra.
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